14

Parei.
Afinal eu ia para onde? Por onde? Onde estava eu? Não fazia ideia…
E de repente lembrei-me. Raios! Como me pude esquecer dele?
- Ionadh? – Chamei. – Ionadh? - Olhei em redor, mas não havia sinais da sua presença.
Forcei-me a recordar o que se passara antes. Como teria ido ali parar? Só me lembrava de ter caído... e… e… … … … … Mais nada. Mas… eu estava encharcada. Caí no rio, aparentemente. E aquelas estranhas personagens sinistras, esquisitas e … doidas … devem ter-me resgatado.
- Oh não… Ionadh? – Insisti. Comecei a correr. – Ionadh? Onde estás?
As minhas palavras pareciam desvanecer-se naquela floresta profunda, e as lágrimas começaram a desfocar a paisagem.
Não havia sinal dele. Nem na floresta, nem no rio, nem na margem. Nada.
- Não! Não, não, não, não… - chorava. Corria tão depressa que não distinguia nada em meu redor.
Senti pontadas na cabeça, provavelmente no local onde tinha batido, e o mundo pareceu começar a cair em escuridão.
Cerrei os olhos e forcei-me por continuar acordada. Não me permitiria sequer abrandar.
Mas inevitavelmente cambaleei até cair e perder novamente os sentidos.

Senti-me despertar.
Abri os olhos lentamente para dar de caras com um tecto em madeira. E do meu lado direito podia ouvir o crepitar de uma lareira.
Sim, estava certa. Era uma lareira. E eu estava deitada num sofá, com um cobertor. E numa mesinha de centro entre mim e o fogo havia um copo de água.
Sentei-me lentamente. Olhei e redor e, não vendo ninguém, dei uns goles.
- Ah! Acordaste – falou uma voz rouca e velha.
Assustei-me e olhei para a esquerda. Da porta surgiu um velho com um manto até aos pés e barbas cinzentas até ao peito, do mesmo comprimento que o cabelo.
Olhei estupefacta. Seria louco? Um psicopata, talvez… Oh meu Deus! Será que me queria engordar e pôr no espeto?
Ele riu. E as minhas suspeitas aumentaram.
- Tens uma imaginação incrível, Ilnarah.
Encaminhou-se até à lareira para compor o fogo.
Ele sabia o meu nome. Mas pior… sabia o que eu tinha pensado. Como?
- Co… Como é que sabe o meu nome?
Olhou para mim, admirado.
- Ora… Conheço-te desde sempre. Como não haveria de saber? Ajudei-te a vir ao mundo eras tu ainda uma alma. – Sorriu. – Tu não querias muito vir, lembraste?
Sem me poder observar, sabia perfeitamente que estava com cara de parva a olhar para aquele velho louco. Por mais que me esforçasse, os meus músculos faceais congelaram. Não conseguia fechar a boca.
Ele ficou sério.
- Ora, não me digas que não te lembras – disse incrédulo e mais exaltado. – Pelas barbas de Merlin. Tu … Baaah – barafustou de braços no ar.
Saiu da divisão e foi a resmungar sozinho.
Ahm… certo…
- Oh não – disse baixinho. – Eu devo estar morta. Estou a sofrer de alucinação pós-morte ou…
A cabeça dele apareceu novamente na porta e fez-me pular de susto.
- Não estás nada morta! – Resmungou imediatamente, de sobrolho franzido.
Voltou a desaparecer da minha vista. Mas podia ouvi-lo resmungar do outro lado das paredes de madeira e pedra.
Subitamente senti uma estranha vontade de sorrir, e talvez rir, com aquele velho.
Ele voltou com um copo de leite e bolachas de mel.
- Toma. Come. Se quiseres. Se não quiseres deixa ficar. Os ratos comem - resmungou. Sentou-se num cadeirão ao lado do sofá onde eu me encontrava e acendeu um cachimbo. Começou a fumar. – COMO RAIO É QUE NÃO TE LEMBRAS?
Assustei-me.
- Bem, eu…
- Baaaah – repetiu.
- Olhe – comecei. Senti que devia explicar a minha situação. - Eu estou muito confusa.
- Isso não é desculpa para não te lembrares de mim.
Agora começava a achar o velhote engraçado. Mas tentei não me rir.
- Não sei onde estou, ou o que se passa. Desmaiei duas vezes hoje. Perdi o meu melhor amigo…
- Está lá fora a caçar moscas – interrompeu.
- E… - parei. O que é que ele disse?
- Mas antes de ires ter com ele, vamos conversar – disse num tom de ordem. Não me atrevi a ripostar. – Ilnarah. Não estás propriamente no teu mundo.
- Como assim?
- Estás no teu mundo, mas não naquele ao qual estás acostumada. Talvez o vás reconhecendo à medida que o percorres. E talvez te vás lembrando de alguns de nós. Costumas vir cá de vez em quando, enquanto dormes. E depois pensas que não passamos de sonhos.
- Mas… “nós” quem?

13

- A questão adequada não é essa, mas mesmo assim não iriamos responder-te! É um assunto privado, o qual não iremos debater contigo. – Acabou por responder, após um momento de silêncio. – Se já estás melhor, regressa a casa. Aqui não é lugar para gente como tu.
As irmãs dela ficaram um bocado desapontadas, mas não declararam nada.
Levantei-me e lancei-lhe um olhar severo.
Sacudi a roupa antes de falar e de a fixar novamente.
- Podes julgar que o assunto não é do meu interesse, mas estás absolutamente enganada! Sei muito mais do que pensas! E tudo o que está relacionado com esta floresta tem a ver comigo.
Aproximou-se de mim com uma ligeireza imprevista e apontou-me o dedo indicador.
- Não fales do que não sabes e não interfiras nos nossos assuntos! Estou a avisar-te, criança humana! Não podes controlar tudo! A tua espécie não nos diz nada! – Asseverou antes de me virar as costas e ir embora.
Porém, deteve-se perto de um antigo carvalho e olhou para trás.
- Se és diferente dos da tua raça, ajuda os restantes a colocarem o seu egocentrismo, o seu orgulho e as suas atitudes extremamente agressivas de lado. Nós não somos inimigos do vosso povo, mas se ele se aliar ao Mal teremos de interferir! Acredita que não seremos benevolentes...
E, de um momento para o outro, fiquei só.
Que momento anormal! Não percebi nada da conversa.
Os vocábulos “...se ele se aliar ao Mal teremos de interferir!” permaneceram na minha mente, repetindo-se insistentemente. Contudo, nenhuma conclusão surgia.
- “Mal”? Mas qual “Mal”? – Questionei o vazio.
Sentei-me por uns reduzidos minutos, que pareceram uma eternidade.
Alguém saberá o que se passa. Alguém tem que saber! E não é uma ameaça que me irá deter, evidentemente!
Levantei-me do tronco caído em que estava sentada e tomei uma decisão.
- É isso! Vou falar com ele! Detém sempre as respostas certas e ajuda-me quando necessito. Ele saberá o que fazer.


Além disso, não sou exatamente o género de pessoa que desiste de um problema...

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